Saturday, July 19, 2008

Hoje o Mar estava bravo…

O Levante acomodou-se na Meia-Praia. Trouxe do mar as suas conchas e algas, uma bandeira encarnada hasteada, banheiros atentos, ondas rebeldes, correntes teimosas, uma água amena, e um vento húmido, um bocadinho frio, mas ideal para pôr as ideias a andar à vela. Trouxe também uma praia mais vazia, o que em Julho é sempre bom. Um passeio a três à beira-mar, a espuma das ondas nos pés e uma boa troca de truques (brincadeiras de praia), cumplicidades e segredos.

Quase parece que não falta mais nada. Nem o sol que se abrigou lá nas traseiras do céu nublado. Nem uma qualquer bebida fresca para matar a sede. Nem um pareo que nos embrulhe e afaste o friozinho. Quase parece que não falta mais nada.

Mas falta.

A pequenina força daquelas mãos miúdas puxam-me para a água. «Mas eu tenho frio», digo. «Não tens… Vamos Gaga!», diz-me o Tomás. Ficaram para trás os tempos em que eu era destemida...

Ficaram lá para trás, no meio das aventuras pelo Molião… Subia de árvore em árvore, descia poços onde o fundo se perdia no escuro, pulava muros, inventava mil e uma tropelias, não tinha medo de me sujar, corria atrás dos animais e até pegava naqueles que hoje me arrepiam (o Tio Luís chamava-me a “Mata-Aranhas” e eu achava que a alcunha era sinónimo de coragem).
Quando chegava à praia fazia parte do mar.

Digo-lhe, ao Tomás, que vou com a condição de não me molhar acima da cintura. «É que eu tenho muito frio», volto a dizer. E volto a ouvir: «Vamos Gaga!» Ficaram para trás os tempos em que eu era destemida...

Convenço o pequenino, mas as ondas não se deixam levar. Mais um bocadinho e já estou no meios das vagas, a minha mão na mãozinha do Tomás em cada investida, desafiando juntos aquele mar que deu o encarnado à bandeira. Por momentos, ganho de novo a sua idade. Ora emirjo, ora salto, os pés para um lado, os braços para o outro, cabelo desalinhado, outro mergulho, outra onda... Discretos ensaios de euforia…

E a espuma das ondas na cara (sempre gostei de me sentar na água em dias de Levante e esperar que as ondas se desfizessem em espuma na minha cara). Que refresco! «Tens frio, Tomás?», pergunto. «Eu não!», diz logo. E eu rio-me com ele (reguila!), recordando-me quando era eu que escondia o tiritar dos dentes.

São duas da tarde e dizem que há umas sardinhas à nossa espera na lota. Peço ao mar que me guarde algures neste Verão outro banho assim. Talvez em Setembro (não há Meia-Praia como a de Setembro…) Foi bom. Saio, abraço a minha toalha, e sinto-me bem com cheiro a sal. Quase parece que não falta mais nada.

Mas falta.

Aceno ao mar bravo já longe e digo “até logo” à praia. Levo de volta na cabeça aquilo que nela se passeava quando lá cheguei. O que falta.

6 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Oi Gracinha!
Só para dizer que continuo cá, atenta aos teus belos textos. Beijocas da Pipitas

9:54 AM  
Blogger Concha said...

Gostei mesmo de ler este texto! O Verão comporta algo de mágico, não é? Quem me dera sair de Lisboa e sentir essa liberdade! Ah, e também dou por mim a ser friorenta, eu que ficava horas no mar! A velhice...

7:08 PM  
Anonymous Anonymous said...

Olá Gaga! Gostei muito da tua historia, escreves muito bem!
Espere que o Xuxu da Gaga tenha
gostado!
beijinhos, Tomás.

7:09 PM  
Blogger June said...

Adorei! Maravilha de texto!
Bjoka

9:48 PM  
Blogger Unknown said...

Nada como relembar da meia-praia em Julho ou Setembro, quando estamos no frio gélido de Novembro.
Detesto o Inverno! E cada vez menos consigo disfrutar da minha meia-praia... Crescemos e adeus férias de 3 meses na praia.

Bjs!

1:50 AM  
Blogger Makejeite said...

E já quase lá estamos de novo.

12:07 AM  

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